Considerando-se os nomes já
divulgados, o ministério do segundo mandato de Dilma Rousseff segue um conhecido preceito bíblico. Está anotado no livro de
Eclesiastes, capítulo 1, versículo 9: “O que foi tornará a ser;
o que foi feito se fará novamente;
não há nada novo debaixo do Sol.”
Dilma
chega ao velho percorrendo um caminho original. No primeiro mandato,
ela havia incorporado ao seu governo escândalos que vieram prontos da
gestão Lula. Já no ano inaugural de sua gestão, teve de afastar um,
dois, três, quatro, cinco, seis, sete ministros.
Reeleita, Dilma
esforça-se para produzir suas próprias encrencas. Revelou-se uma grande
compositora. Compõe com todo mundo —do herdeiro do Jader ao amigo do
Serra; do apadrinhado do Renan ao ex-ministro de FHC; do comunista do
‘B’ ao discípulo da Universal… Encontra-se quase tudo no selecionado de
Dilma, exceto um rumo.
Ao condicionar a nomeação de ministros ao
aval do procurador-geral Rodrigo Janot, Dilma dera a entender que
aprendera alguma coisa com o escândalo da Petrobras. Engano. Inaugura
2015 com um ministério loteado segundo os mesmos critérios que
converteram a maior estatal do país numa megajazida de propinas.
Janot
negou a Dilma, por absurdo, o acesso ao pedaço sigiloso da Operação
Lava Jato. Porém, se estivesse realmente interessada em extrair lições
da lama, a presidente poderia ter desperdiçado alguns minutos com o
depoimento que o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa prestou ao
juiz Sérgio Moro em audiência pública da Justiça Federal. Deu-se em 8 de
outubro.
Está disponível na web em áudio, vídeo e texto. A
alturas tantas, o magistrado quis saber do depoente: por que as maiores
empreiteiras do país pagaram propinas de 3% sobre o valor dos contratos
celebrados com a Petrobras?
— Essas empresas, Excelência, tinham
interesses não só dentro da Petrobras, mas em vários outros órgãos de
governo, a nível de ministério, a nível de secretaria, etc., disse Paulo
Roberto.
O delator recordou ao juiz que os ministérios são comandados por partidos políticos. E prosseguiu:
—
“Então, se a empresa deixasse de contribuir com determinado partido
naquele momento, isso ia se refletir em outras obras… Os partidos não
iam olhar isso com muito bons olhos.
Sérgio Moro perguntou a Paulo
Roberto se ele já havia testemunhado algum caso de empreiteira que
tivesse se negado a pagar as propinas.
— Não, nunca. Houve alguns
atrasos. Mas nunca tive conhecimento que deixaram de pagar, devido a
esses interesses maiores a nível de Brasil.
O juiz perscrutou: e se as empreiteiras fechassem o cofre? Paulo Roberto, “a nível de” didatismo, caprichou:
—
Essas empresas tinham interesses em outros ministérios, capitaneados
por partidos. São as mesmas empresas que participam de várias outras
obras a nível de Brasil —ferrovias, rodovias, hidrovias, portos, usinas
hidrelétricas, saneamento básico, Minha Casa, Minha Vida. Ou seja: todos
os programas, a nível de governo, nos ministérios, têm políticos e
partidos. Se você cria um problema de um lado, pode-se criar um problema
do outro. No meu tempo lá, não lembro de nenhuma empresa que tenha
deixado de pagar.”
Num país em que a restauração da moralidade
depende do suor do dedo de personagens como Paulo Roberto, quem consegue
segurar o vômito provavelmente está mal informado. Feita essa ressalva,
é possível enxergar o lado bom do ministério de Dilma. Mesmo que seja
necessário procurar um pouco.
Por exemplo: num instante em que o
brasileiro lamenta que a Petrobras tenha descido ao balcão, é
alvissareiro notar que a nova equipe de Dilma não aumenta a taxa de
fisiologismo na Esplanada dos Ministérios. Continua nos mesmos 100%.
Algo que torna o lema da campanha do PT —‘Governo novo, ideias novas’—
perfeitamente realizável. Mediocridade e mesmice não faltam.
A
equipe de Dilma ainda não está completa. Até o final do ano, ela trará à
luz os nomes de mais duas dezenas de ministros. A julgar pela amostra
inicial, a presidente fará o pior o melhor que pode. Errar qualquer um
consegue. É humano. Mas Dilma escolhe o erro com raro esmero. Parece
decidida a demonstrar que, entre o certo e o errado, há sempre lugar
para mais equívocos.